Fisioterapeutas não podem mais praticar a acupuntura, alerta o próprio Conselho

Com base na Lei do Ato Médico, profissionais de fisioterapia que se anunciarem como especialistas em acupuntura cometerão infração ética

Por decisão judicial transitada em julgado, o Conselho Federal de Fisioterapia Ocupacional (COFFITO) retirou a acupuntura do seu rol de especialidades no início de 2023. De acordo com o artigo 30 do Código de Ética e Deontologia do Fisioterapeuta, os incisos II e III proíbem a divulgação de título de especialista profissional que não atenda às regulamentações específicas editadas pelo COFFITO. Assim, se um fisioterapeuta se anunciar como especialista em acupuntura, cometerá uma infração ética.

Permitir a realização da prática da acupuntura e/ou atividade de ensino por ou para não médicos, configura exercício ilegal da profissão e publicidade enganosa, conforme previsão contida no artigo 37, inciso 1° do Código de Defesa do Consumidor, causando danos à coletividade, especialmente à saúde pública.

Em um parecer publicado em 20 de fevereiro de 2023 pelo Colégio Médico Brasileiro de Acupuntura, o presidente Dr. André Wan Wen Tsai explica que a segunda parte do inciso XIII do artigo 5° da Constituição Federal estabelece a possibilidade da restrição legal da liberdade para o exercício das profissões, quando diz: “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.

“Assim, somente o profissional que possui em sua lei autorização expressa para realizar determinado ato é que pode fazê-lo”, diz o documento, destacando a importância da Lei do Ato Médico no Brasil.

Se um fisioterapeuta se anunciar como especialista em acupuntura, cometerá uma infração ética/ Foto: Instagram CFM

Mas o que é a Lei do Ato Médico?

A Lei 12.842, de 2013, foi aprovada após 12 anos de tramitação e mobilização das entidades médicas. Ela especifica, por exemplo, que perícia e auditoria médica, ensino de disciplinas especificamente médicas e coordenação dos cursos de graduação em medicina, tanto dos programas de residência quanto dos cursos de pós-graduação, são atividades exclusivamente médicas.

De acordo com a lei, outros 11 outros atos são exclusivos dos médicos, como a indicação e execução de cirurgias e a prescrição de cuidados médicos pré e pós-operatórios. Integram ainda esse rol procedimentos invasivos, sejam diagnósticos, terapêuticos ou estéticos, e a realização de acessos vasculares profundos, biópsias e endoscopias.

O Ato Médico também cita como exclusividade dos médicos a intubação traqueal, a coordenação da estratégia ventilatória inicial para a ventilação mecânica invasiva, as mudanças necessárias diante de intercorrências clínicas, e programas de interrupção da ventilação mecânica invasiva, incluindo a desintubação traqueal.

Os procedimentos anestésicos (como sedação profunda, bloqueios anestésicos e anestesia geral), periciais (perícia médica e exames médico-legais), atestações (de condições de saúde, doenças e possíveis sequelas, bem como de óbito), emissões de laudo (de exames endoscópicos e de imagem, procedimentos diagnósticos invasivos e exames anatomopatológicos) e indicação de internação e alta médica também são listados. A atividade milenarmente médica de determinação do prognóstico relativo ao diagnóstico nosológico também foi contemplada.

A lei foi uma grande conquista da classe médica e traz inovações importantes, dirime dúvidas e especifica o campo de atuação do médico.

Acupuntura: só médicos podem realizar procedimentos invasivos

Com base na Lei do Ato Médico, o parecer do CMBA indica que a prática milenar da acupuntura pressupõe a realização de prévio diagnóstico e a inserção de agulhas em determinados pontos do corpo humano, a depender do mal diagnosticado no exame e a prescrição de tratamento.

Essa mesma lei, no seu artigo 4°, expressa que é privativo do médico a indicação da execução e execução de procedimentos invasivos. “Ora, um procedimento tipicamente invasivo é a acupuntura e o texto legal restringe a indicação da execução e a execução desse tipo de procedimento invasivo somente a médico”, reforça o presidente do CMBA, no documento.

O parecer ressalta que, apesar de não existir no ordenamento jurídico lei específica regulando a atividade de acupuntor, não pode qualquer profissional não médico, praticar atos que atos que sua legislação profissional não lhe permite, como a acupuntura, sob pena de ferir-se o inciso XIII do artigo 5° da Constituição.

“Não existe fundamento jurídico, doutrinário ou jurisprudencial para que profissionais não médicos pratiquem a acupuntura no Brasil nos dias de hoje e permitir a prática de acupuntura por profissionais que não possuem autorização legal para tanto, é assumir responsabilidade solidária com a realização desses atos e desrespeita o princípio constitucional mais importante da Administração Pública que é o Princípio da Legalidade.

“Assim, outro profissional da saúde ou não e/ou qualquer técnico, mesmo que se diga capacitado e com certificado/diploma de curso, não tem habilitação legal para a prática da acupuntura, seja Biomédico, Biólogo, Enfermagem, Farmacêutica, Fisioterapeuta ou Terapêutica Ocupacional, Fonoaudióloga, Nutricionista, Psicóloga, ou Profissional de Educação Física”, cita o parecer.

O documento destaca ainda que o “agulhamento a seco” é prática derivada da acupuntura e intervenções que necessitam de diagnóstico, com procedimentos invasivos, praticados por profissional não habilitado pode acarretar sérios danos à saúde das pessoas.

Custo-benefício da acupuntura no SUS

O Dr. Luiz Sampaio, primeiro secretário do CMBA, explica que a acupuntura é uma forma de tratamento não medicamentoso e, portanto, sua indicação e aplicação somente deve se dar após um diagnóstico médico. “O tratamento por acupuntura, como qualquer outra modalidade terapêutica, tem suas indicações, suas contraindicações e efeitos adversos.”

“Outras modalidades de diagnóstico tais como o psicológico, o fonoaudiológico ou o cinesio-funcional, da fisioterapia, são específicos para os tratamentos psicológicos, fonoaudiológico ou fisioterápico, porém não abrangem o diagnóstico nosológico, que é um ato exclusivo médico”, reitera Sampaio.

Segundo ele, somente por meio do diagnóstico nosológico o médico identifica a causa de uma dor. “Se uma dor lombar, por exemplo, decorre de um de uma fratura, de um tumor, de uma hérnia extrusa ou se de uma alteração miofascial”, completa.

Conforme o Dr. Sampaio, a grande demanda do tratamento por acupuntura está na área da dor de qualquer natureza, exceto nos diagnósticos que têm como indicação primária o procedimento cirúrgico. “A acupuntura pode ser utilizada como tratamento principal ou como adjuvante da dor dentro de praticamente todas as especialidades médicas.”

“Estudos também demonstram uma ação imunomoduladora, podendo também ser utilizada nas doenças que decorram de uma resposta imune exacerbada, como no caso da psoríase com ou sem repercussão articular, artrite reumatoide, na asma brônquica e rinite alérgica ou nas decorrentes de deficiência do sistema imune, tais como processos infecciosos virais ou bacterianos de repetição”, cita o médico.

Ainda de acordo com ele, na psiquiatria, como foi demonstrada a liberação de opioides internos e de serotonina, a acupuntura tem aplicação nos casos de insônia, crises de angústia ou pânico e depressão leve.

Sampaio reforça que a acupuntura deve ser realizada pelo médico acupunturista com o devido Registro de Qualificação de Especialista (RQE) no Conselho Regional de Medicina (CRM) de seu estado de atuação.

O RQE é conferido aos médicos que concluíram o programa de Residência Médica, conforme os ditames da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM) ou que tenham o Título de Especialista outorgado após aprovação na prova de suficiência, aplicada pelo CMBA, pela Associação Médica Brasileira (AMB).

“Está em implantação um programa de capacitação de médicos de família, numa parceria da Universidade Federal de Santa Catarina com o CMBA, para que esses possam se utilizar do método terapêutico nas ações da atenção básica”, informa o secretário.

Ele lembra, ainda, que em São Paulo houve um programa de capacitação de médicos que trabalham no Sistema Único de Saúde (SUS) com a técnica de Craniopuntura de Yamamoto, que acabou descontinuado, com a alegação de falta de recursos. “A acupuntura tem como vantagem, no atendimento público, a relação custo-benefício, tanto para a entidade pública, como para os pacientes”, comenta Sampaio.

“Como a maior demanda da atenção pública se concentra na área da dor e, principalmente, na dor crônica, a diminuição de gastos com medicamentos anti-inflamatórios e analgésicos traz uma economia significativa para os órgãos públicos, bem como uma diminuição dos efeitos colaterais desses medicamentos, quando utilizados por longos períodos”, justifica o médico.

De acordo com ele, nos pacientes oncológicos, a acupuntura, além de minimizar os efeitos colaterais dos tratamentos por rádio ou quimioterapia, favorece a diminuição do uso desmedido de opioides, reduzindo seus riscos de dependência e habituação.

 

Por: Comunicação AML – Divulga e Infinita Escrita

 

 

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